sábado, 25 de junho de 2011

O INSTITUTO (IN)DEFENSÁVEL DA DELAÇÃO PREMIADA: A (I)LEGÍTIMA 'PREMIAÇÃO'

O INSTITUTO (IN)DEFENSÁVEL DA DELAÇÃO PREMIADA: A (I)LEGÍTIMA 'PREMIAÇÃO'  por MORETTO, Thaís Zanetti de Mello.
Coluna publicada no dia 28 de abril de 2011 no Jornal de Pelotas.

sexta-feira, 3 de junho de 2011

Em resposta ao blog do Marcelo Pacheco: necessário pensar e refletirmos a questão

Sobre a discussão em torno da maconha: a minha opinião!!!!!

... a terra totalmente esclarecida resplandece sob o signo de uma calamidade triunfal” (Adorno e Horkheimer)



Esperei o tempo necessário para refletir sobre o tema da liberação da maconha ou da descriminalização do usuário. Não é um tema simplório e qualquer opinião deve sempre respeitar um espaço de responsabilidade.



A resposta não deveria ser favorável ou não favorável. As implicações são maiores e exigem uma tomada de posição clara, ainda que nenhuma possa ser definitiva. Apenas gado não muda hábitos, somente os simplórios e pobres de espírito se estabelecem a partir de dogmas.



Em primeiro lugar, eu não sou favorável a liberação da maconha. Preconceito? Ignorância? Postura pequeno burguês? Admito todos esses rótulos. Mas explico o porquê de minha posição: vivo no Brasil, país latino americano que ainda busca consolidar uma série de proposições da modernidade política, econômica, social e, essencialmente, cultural. Quer dizer: somos um país que está distante de qualquer pacificação. Miséria, desigualdade social, um corpo político corrupto, patrimonialista e coronelista, espaço social marcado pela impunidade, um governo hipócrita, uma cidadania frágil e perdida. Ao mesmo tempo, nos porões da sociedade legal se percebe a conexão daquelas condições destacadas acima com o narcotráfico e com o crime organizado. A realidade é que no Brasil o Estado não tem condições de controlar essas conexões, mesmo no atual combate ao consumo e tráfico de entorpecentes, o que se dirá, com a possibilidade da legalização da maconha.



Em segundo lugar, qual o fundamento consistente para os que defendem tal legalização? Falar nos usuários nesse momento é um equívoco, já que não se pode confundir a legalização da maconha com a descriminalização dos que a consomem. São estados de coisas diferentes. A maconha é uma droga, com todo o axioma que o conceito 'droga' carrega de forma intensa e intencional. Mesmo as ditas drogas legais já sofrem críticas ao uso indiscriminado. Afirmar que a maconha poderia ser controlada é uma demagogia cretina e imbecil, pois é deliberadamente fingir que não se percebe as condições concretas em que no nosso país se realizam os fatos do dia a dia.



Em último, já que não sou autoridade, nem mesmo isso é uma tese, não tenho simpatia pela possibilidade de conviver em público com os usuários dessa droga legalizada. Mesmo sabendo que isso não vai acontecer, não gosto da imagem. Da mesma forma que não aprecio fumantes próximos a mim, bem como usuários de bebidas alcoólicas, também me dou ao direito de estar afastado desse perfil de consumidor. Outra posição típica e conservadora? Provavelmente sim. Mas o mundo não é somente formado por reformadores progressistas em luta contra conservadores reacionários, bem assim, todos somos uma complexidade de contradições, pois se não gosto da imagem que destaquei acima, isso não significa que sou um cretino, ainda que para alguns, por motivos que se consideram justos, eu seja mais um cretino.
Sou favorável a descriminalização do usuário, totalmente. Não se pode confundir o uso com o tráfico, e, convenhamos, apesar de algumas campanhas exageradas, a tal da guerra contra o consumo de drogas já está há muito, perdida, constate-se o crescimento do crack e do oxi e as dificuldades que se encontram para evitar essa sangria antropofágica.



O usuário não é um deliquente. A sua penalização não compreende as condições que o levaram ou levam ao consumo. Tratá-lo em alguma medida como um criminoso, mesmo com penas alternativas, é reduzir a questão ao universo do jus imperium, isto é, da vontade do Estado. O usuário também não pode ser visto apenas a partir da ótica da vitimização. Ele não é um pobre coitado, como muitos movimentos tentam constituí-lo. As opções pelo uso ou não de uma droga são múltiplas, ainda que a sociedade teime em restringi-la a um ambiente maniqueísta de bem e mal.



Entretanto, me resta uma dúvida: a descriminalização do usuário, lembrando que o judiciário está abarrotado de processos nesse sentido, e que o sistema prisional não admite mais espaço nem mesmo para pedófilos, sociopatas ou corruptos, não traz implicação, de alguma forma, com o tráfico?


O que me surpreende de forma negativa é ver a sociedade se organizar para essa situação em torno da maconha, o que é um fato de participação absolutamente importante, mas ao mesmo tempo, desinteressada de tantas outras questões fundamentais, importantes e vitais para a maturidade de nossa cidadania. Infelizmente, em nossa sociedade, somente aquilo que pode alcançar algum tipo de midiatização, glamourização e espetáculo parecem atrair tanto as novas gerações, quanto as decrépitas, ainda que lideradas por um ex-presidente em um vídeo documentário.

Em resposta ao blog do Marcelo Pacheco:
Por Thaís Zanetti de Mello Moretto

Primeiro, a questão é bastante complexa para ser tratada desta forma.
Segundo, é que este tipo de discurso – nos - revela o quanto somos 'contaminados' sistematicamente pelo universo midiático. Isso implica dizer que os estereótipos que - temos - de usuários e dependentes químicos fortalece o discurso repressor e, sem dúvidas, este processo pode ser estabelecido de forma inconsciente. A ideia maculada de consumo de drogas (veiculada) dá conta de certo 'padrão' de comportamento, como se todos os usuários e todos os dependentes químicos tivessem a (mesma) imagem transmitida: basta ver a propaganda veiculada pela RBS 'Crack nem pensar', como se não fosse de se pensar realmente. O exemplo da imagem e da referida propaganda, dão conta, apenas, de poucos exemplos de como obstaculizar a consciência que deveríamos ter sobre as drogas, mas que, erroneamente optou-se pelo – nem pense – ao invés de um: tome consciência!
De que adianta se achar culpados? E aqui, mais uma vez, o problema é muito mais complexo do que isso. É que se falamos que consumidores devem permanecer na ideia de descriminalização (muito embora eu não acredite nisso) o quadro se amolda a descarcerização efetivamente, é que não podemos confundir descarcerização com descriminalização. Quem seria o culpado? Não há culpados! E parece esquizofrênico querer achar um. Seria simplismo demais acharmos um, já que a questão das drogas ultrapassa este limite. A disseminação do uso e do comércio de drogas é uma realidade, uma situação sintomática pós-moderna que não será estancada com proibicionismos criminalizadores.
Precisamos ter consciência (também) que quando revelamos discursos menos prejudiciais aos consumidores, em contrapartida estamos incrementando o punitivismo aos traficantes de drogas. Além disso, há que se olhar esta questão racionalmente, ou seja, longe de sentimentalismos ou posições pessoais e - distantes - do que efetivamente necessitaríamos. E podemos fazer isso de verdade quando utilizamos as palavras, já que elas dizem tanto, e muitas vezes até mais do que gostaríamos já que produzem significados. Palavras como ‘combate’, ‘guerra’ expressam ‘combate ao tráfico de drogas’, ‘guerra ao tráfico de drogas’ que nada mais é do que dizer – em outros termos – combate (e) guerra aquele que comercializa as drogas ilegais, e isso reforça o caráter repressor.
As toxicomanias são um sintoma social (Melman), na medida em que é um discurso dominante de uma sociedade, um sintoma que revela uma verdade (Freud) que é o mal-estar ma civilização, ou dito de outro modo, a civilização é um mal-estar. Lembremos que nossa sociedade é, em larga medida, consumista (Bauman), é hedonista, e não há como (não) esperar pela vontade de gozar, exatamente pela tensão desejante que se dá no estado de falta (Melman).
Há muito mais do que querer proibir, há muito mais do que querer criminalizar, há muito mais do que viver do expansionismo do sistema. Há a necessidade aguda de mudança, e a mudança se dá pelo viés oposto. Já se viu que a trilha proibicionista fracassou!!! Como querer tratar com direito penal um caso que é de saúde pública(?) Como querer tratar com direito penal questões eminentemente sociais(?)
Devemos aprender a lidar com as diferenças, e sobremaneira aceitá-las, de modo algum reforçá-las. O preconceito em sua forma mais representativa e comum só pode surgir a partir de certo grau bem determinado de “estupidez”, de incapacidade humana, ou seja, de racionalidade acrítica (entenda-se por estupidez: suscetibilidade à tentação da auto-anulação pela sedução da massa). Em estado de preconceito não existe mais indivíduo. (Timm) É hora de (re)pensarmos esta postura. Sairmos da zona de conforto. Não odiarmos mais o Outro (Lacan) - ele não precisa disso! Se temos que nos cuidar, esse cuidado deve ser destinado aos discursos dos (In)vulneráveis, porque são eles os responsáveis pela (des)culturação progressiva do Outro. 
Abraço,
Thaís Zanetti de Mello Moretto