terça-feira, 13 de julho de 2010

A saúde pública e a legalização do aborto

Margareth Arilha

Pesquisadora do NEPO – Núcleo de Estudo de População da UNICAMP e diretora executiva da Comissão de Cidadania e Reprodução.

Recente pesquisa desenvolvida pela ANIS e pela Universidade de Brasília, mostrou que 1 em cada 7 mulheres de até 40 anos já realizou aborto ; se consideradas apenas as mulheres de 35 a 49 anos, esta relação cai para 1 em cada 5 mulheres. Foram ouvidas 2002 mulheres entre 18 e 39 anos, das capitais brasileiras e de municípios acima de 5000 habitantes, excluindo-se aquelas mulheres que viviam em áreas rurais e analfabetas. Os dados indicaram que o aborto é mais freqüente entre as mulheres com menor nível de escolaridade, não havendo no entanto diferenças em função das religiões adotadas O estudo mostrou também que entre as mulheres que abortaram, cerca de 48% usaram algum medicamento, e que 55% delas ficaram internadas em razão do procedimento.A grande relevância destas informações é que mostram que as mulheres seguem abortando sem encontrar respostas contundentes para essa demanda cidadã nas políticas públicas de saúde.

Há duas maneiras de superar este grave problema de saúde púbica: realizando a prevenção da gravidez com acesso amplo a todos os métodos anticoncepcionais cientificamente aprovados, como dispõe nossa Constituição e, ao mesmo tempo, descriminalizando e legalizando o aborto neste país. No caso do Brasil, a última pesquisa da PNDS ( 2006) mostra que cerca de 50% das gravidezes ainda são indesejadas pela mulheres, número evidentemente significativo . Em que pese o esforço bem sucedido de décadas em fazer avançar o acesso e uso a contraceptivos no país, as diferenças regionais são relevantes. Como exemplo, na região Norte apenas 13% das mulheres unidas de 15 a 44 anos usam anticoncepção oral, enquanto que este percentual sobe para 39% quando analisamos os dados da região Sul do país.

As mulheres pobres tem o direito de ter um entorno de maior segurança e respeito para seguir vivendo sem ter que pagar o preço da clandestinidade, da vergonha, do sofrimento ou da morte ao realizar um aborto.Por que seguir impedindo mulheres de anteciparem o parto nos casos de anencefalia comprovada? Por que impor ao Brasil um ´Estatuto do Nascituro´, dando poderes absolutos a um óvulo fecundado, esquecendo totalmente o corpo que lhe dá contornos? Um país que se projeta globalmente como liderança política e econômica não pode manter suas mulheres submetidas a práticas de saúde tão primitivas e tão perversas. A anticoncepção já é aceita nacionalmente. Falta-nos a outra vertente para que possamos superar esse problema de saúde pública: legalizar o aborto de maneira que ele possa ser feito dentro de certos limites de tempo, à luz do dia e não na clandestinidade, por profissionais capacitados, e sem ser considerado uma prática escandalosa realizada por mulheres sem sentimentos amorosos.

O aborto precisa ser feito de um jeito que seja legal para todos.
Vamos mudar?

Fonte: Jornal da Tarde, texto encaminhado pela Profª Virgínia Feix

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